António Sampaio nasceu em Vila Nova de Gaia a 19 de agosto de 1916. Aos 14 anos inscreveu-se no curso Preparatório da Escola de Belas Artes do Porto. É neste período que tem oportunidade de conviver com artistas plásticos e arquitetos como Abel Moura (1911-2003), Guilherme Camarinha (1912-1994), Januário Godinho (1910-1990), Fernando Távora (1923-2005), Nadir Afonso (1920-2013) e Dominguez Alvarez. Em 1932, ingressa no Curso Especial de Pintura da Escola Superior de Belas Artes do Porto e, entre 1937 e 1944 no Curso Superior de Pintura desta mesma instituição. É discípulo de Dórdio Gomes (1890-1976) e de Joaquim Lopes (1886-1956). De Dórdio Gomes notar-se-á na sua obra, particularmente nas paisagens do Marão, especial influência, como de Almada se sente na pintura que marca a década de 1960.
António Sampaio conciliou o seu percurso académico com o trabalho na Cerâmica Lusitânia. Nesta altura, executa também frescos para casas particulares e estabelecimentos comerciais. Contudo, em 1938, já havia vendido algumas das suas pinturas dentro do circuito da denominada elite intelectual portuense. É esta rede de contatos e a vontade antirregime que, apesar da descrição e reclusão com a arte que sempre caracterizou António Sampaio, que, em 1940 a fundar, com outros tertulianos, a Sociedade Editora do Norte, que publicava um jornal clandestino. O grupo reunia-se no Café Majestic, no Porto e incluía nomes como os de Eduardo Santos Silva (1879-1960), Lobão Vital, Virgínia Moura (1915-1998), Artur Vieira de Andrade (1913-2005) e Januário Godinho.
Em 1941 realiza a sua primeira exposição individual no Salão Silva Porto, no Porto. Desde essa data e até 1993 não deixou de o fazer, tanto em Portugal como no estrangeiro. Participou, igualmente, em inúmeras coletivas patentes em instituições como a Sociedade Nacional de Belas-Artes, o Secretariado Nacional de Informação, o Museu Nacional Soares dos Reis ou o Museu Municipal Amadeo de Souza-Cardoso.
Nos anos 40 do século XX participará, também, em várias exposições dos Independentes, movimento que provocará uma profunda alteração na pintura portuguesa. Promovidas por estudantes da Escola de Belas-Artes do Porto (onde se destaca Fernando Lanhas), entre 1943 e 1950 foram realizadas as Exposições Independentes. Segundo Fernando Guedes, “o mérito maior destes «independentes» […] foi o de terem apresentado pela primeira vez arte abstrata realizada em Portugal e, pela insistência nessa apresentação ao longo dos anos, a terem tornado mais ou menos familiar ao público“[1].
Em 1945 casa com Maria Thérèse Beyer de quem teve duas filhas (Maria Antónia, 1949 e Maria Teresa, 1951). Nesse mesmo ano inicia uma longa carreira como docente do ensino secundário. Lecionou na Escola Industrial Infante D. Henrique e na Escola de Artes Decorativas Soares dos Reis, no Porto; na Escola de Cerâmica de Viana do Alentejo (onde se iniciará nos trabalhos em cerâmica com o mestre Lagarto), na Escola Industrial de Oliveira de Azeméis, em escolas da Covilhã, Faro e de Lisboa e em Viana do Castelo, onde se reformou em 1986.
“Paris, 1947: a cidade enfim! Urbanidade, comunidades de artistas, ateliers, respiração natural da arte, cosmopolitismo, azáfama de pós-guerra, museus, academias de vários tipos, pintores de rua, contatos com figuras de todas as nacionalidades, escolha. Paris representou uma oportunidade única para António Sampaio e a pintura que de lá trouxe, bem como o grande número de desenhos, revelam a evolução registada.”[2]
As viagens fizeram sempre parte da sua vida mas há uma inicial, em dezembro de 1947, para Paris que, não só é marca da pintura como marcará o seu percurso pictórico, como também se fará notar nesta exposição. Em Paris, até ao Verão de 1948, frequentou as academias La Grande Chaumière e Julian, os ateliers dos pintores André Lhote (1885-1962) e Fernand Léger (1881-1955) e o atelier de fresco de Duco de La Haix, assim como a Escola de Belas Artes. Conviveu com Júlio Resende (1917-2011) Nadir Afonso, com o pintor checo Frantisek Emler (1912 -1992) e com o poeta André Figueras. Conheceu Vieira da Silva (1908-1992) e Arpad Szenes (1897-1985) e fez gravura, estudos de nus, cenas de interior e vistas citadinas, etc.
No decurso da sua carreira são várias as colaborações artísticas a registar, os trabalhos em cerâmica, com expressão pública; mas também os trabalhos em tapeçaria ou as decorações com pintura a fresco para vários estabelecimentos comerciais, sobretudo na cidade do Porto.
No contexto dessas colaborações, devemos realçar, em 1954 a abertura da Galeria Alvarez (inicialmente Academia Alvarez). O grupo, que toma o pintor Dominguez Alvarez (1906-1942) como mestre, homenageando-o, tem em Sampaio e Jaime Isidoro (1924-2009) os principais dinamizadores. Os dois amigos estarão, também, na criação e dinamização dos Encontros Internacionais de Arte (1974 a 1977) e da Bienal Internacional de Arte de Cerveira (1978). Esta amizade entre os dois tem, de resto, diversas evidências e o próprio Jaime Isidoro dela dá nota numa carta autobiográfica publicada pouco tempo antes da sua morte. Em 1978, Almada Negreiros (1893-1970) e Sarah Afonso (1899-1983) foram os artistas homenageados da I edição da bienal mais antiga da Península Ibérica e a coleção da Fundação Bienal de Arte de Cerveira integra, precisamente, uma obra que António Sampaio realizou nos ateliers livres, dedicada à Almada. “Pintura-Poema” (acrílico sobre aglomerado, 107x90cm) é assim evidência da estreita relação que o artista estabeleceu com o Alto Minho. Em 1978 adquiriu uma casa em Gouvim, Gondarém, em Vila Nova de Cerveira, que começou a restaurar em 1979. Ficou-se nesta casa na década de 1980. A sua ligação à “Vila das Artes” foi, por isso, também morada, atelier, família. Foi por isso com grande pertinência que assinalamos, também, os 100 anos do seu nascimento com uma exposição retrospetiva em 2016.
António Sampaio dividiu a sua produção artística entre a pintura e o desenho, mas também pelo fresco, pela cerâmica (tendo executado vários painéis cerâmicos) e pela tapeçaria. No que respeita ao objeto da pintura, António Sampaio, deteve sempre o olhar sobre a paisagem e sobre a memória dos lugares de passagem, sendo o atelier o lugar de encontro desse vislumbre. Pintou e desenhou paisagens, designadamente de Sintra, do Minho, do Marão e lugares sossegados e enigmáticos, numa fase de afastamento da vida pública (1975).
Um artista sem tempo ou género, António Sampaio soube beber influências dos lugares e das relações que estabeleceu ao longo da vida. Preferiu, muitas vezes, a reclusão do atelier à movida da cidade. Contudo, em todos os lugares onde trabalhou e viveu, rodeou-se sempre de amigos como os pintores Domingos Alvarez e Carlos Carneiro (1900-1971), o escultor Arlindo Rocha (1921-1999), os poetas Pedro Homem de Melo (1904-1984), Teixeira de Pascoaes (1877-1952), Sebastião da Gama (1924-1952), Júlio-Saúl Dias (1902-1983) e António Porto Além, o violinista Herberto de Aguiar, a escritora Luísa Dacosta (1927-2015), os irmãos Ernesto e Eduardo Veiga de Oliveira, Alexandre e Júlia Babo e o mestre ceramista Lagarto. Entre os anos 60 e o 25 de abril de 1974 recebeu gente das artes e do jornalismo no seu ateliê da Casa de Gondomar, ou “Casa do Rio”, riscada por Fernando Tudela e para a qual se muda em 1963. A morada de Gondomar somou-a à de Vila Nova de Gaia, à de Águas Santas (Maia), à de Viana do Alentejo, do Porto e de Gouvim (Vila Nova de Cerveira).
[1] ALMEIDA, Bernardo Pinto de – Pintura Portuguesa no Século XX. Porto: Lello& Irmãos Editores, 1993. Página 92.
[2] CASTRO, Laura – António Sampaio (1916-994). O Homem e a Obra. Porto: Árvore – Cooperativa de Atividades Artística, C.R.L., 1994. Página 50.